segunda-feira, 3 de maio de 2010

D'o Desvio

E ao fim de tanto tempo,

tantas ruas,
tantas caras,
tantos sons,
tantos quilómetros,
tantas papoilas,
tantas paisagens,

tantos anos...

Cai finalmente em si.
Olha para trás e pergunta-se, como foi ele parar ali. A uma cidade que não é sua, numa rua em que o macadame se confunde com o cinzento molhado dos paralelos.

Tudo seria da mesma cor naquela noite e não seria apenas por um mero acaso.

Clinicamente descompensado, dir-lhe-iam caso houvesse sequer alguém por perto, quanto mais um médico. E naquele momento fervorosamente contava as gotas de chuva que iam caíndo, vertendo uma lágrima mais intensa por cada uma que falhava.

"Dizem que é preciso parar..."

Mas ele nunca parara. O verbo VIVER corria-lhe nas veias como um veneno que o levaria a cometer o suicidio mais longo da história. Era para isso que ele tinha vivido. Para sentir o calor do coração a bater mais forte em cada ofegante respiração. Para inspirar intensidade por aqueles pequeninos olhos que doravante só veriam imagens mentais perturbadas.

Ao renegar uma vida simples e eficaz, propusera-se a construír um emaranhado de vivências. Estas haviam calcificado e formado corredores labirinticos onde assentava toda a sua já de si frágil estrutura emocional.

Uma casa, um cão, uma piscina... e uns olhos bonitos para a morte. Tudo o que ele sempre negou. A necessidade de refúgio desprezada até ao limite das suas discussões infindáveis, agora pronta a desabar por cima das suas trémulas pernas.

Falha mais uma gota... e outra... e ruge... e mais três... e um desespero...

e num instante apenas...

T
o
d
a
s

c
a
i
e
m

a
o

c
h
ã
o
!
....................... (num estrondo que lamento ver-me impossibilitado de descrever)



Com elas, também ele cai desamparado... Chora... E pergunta porquê.

"Porquê?"

"Porquê eu? Onde terei falhado? Onde é que todos acertaram e eu falhei? Como pode a vida simplificada ter tão pouco significado para mim e no entanto todos à minha volta conseguirem usufruir dela e... e vivê-la... e quase serem felizes. Não faz qualquer sentido"

...


* * * *


- Aqui estás tu... Procurei-te por todo o lado. Da próxima vez que beberes desta forma vê se aterras na cama e não na ombreira da porta, amor. Anda. Os miudos querem que os leves ao McDonald's almoçar...






A

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